segunda-feira, 7 de dezembro de 2009

O garoto do rio

Não sou um cara nostálgico, mas determinadas cenas nos remetem a um passado distante que deixou marcas profundas na vida de um garoto sonhador. Lembro com precisão a primeira vez que meu avô Artur de Oliveira levou os seus netos para pescar com tarrafas no Canal de Marapendi na Barra da Tijuca na década de 70. Eu tinha uns 10 anos, e estavam de férias em pleno verão carioca de 40 graus. Fiquei tão ansioso com a pescaria, que não conseguia dormir na noite anterior, e durante a semana inteira não falava em outra coisa para os meus amigos da rua Anhanguera. Parecia que iríamos caçar a baleia Moby Dick em alto mar. A paixão do meu avô pela pescaria foi transmitida geneticamente para o meu filho João Victor, que hoje se encontra também ansioso para subir o rio São João, em Barra de São João a bordo da voadeira de seu avô materno Enéas, que mesmo com seus 73 anos bem vividos, continua sendo o garoto do rio São João. A expectativa da viagem alimenta fantasias, sonhos e torna-se fonte de inspiração futura, assim como aconteceu comigo. Nos tempos do Império, a Beira Rio tornou-se local de pernoites do imperador Dom Pedro II, quando de sua viagem para Campos dos Goytacazes e local de recreação de Casimiro de Abreu, onde certamente versejava para a eternidade.
Segundo o menino do rio, nas décadas de 40 e 50, no período da Segunda Grande Guerra Mundial, sua infância e adolescência foi tranqüila na Beira do Rio São João, onde barato viver e mesmo com o racionamento de energia, não faltava um peixinho na panela de Dona Martinha. Enéas Gomes da Silva, com suas histórias de pescador que nunca se aposenta, conta-nos que mesmo sendo filho de Armação dos Búzios, sua história está intimamente ligada ao rio São João, pois foi ali que praticou suas travessuras de garoto, mergulhou fundo nas águas turvas do rio e buscou sua alimentação. Foi ali, que trabalhou na fábrica de tamancos do prefeito para a construção da Igreja Assembléia de Deus na Rua Dr. Salgado Filho. Naqueles tempos, como bem definiu o escritor Ruy Castro: “Ali todos eram iguais e ninguém era mais igual do que os outros”. Para muitos, o velho Enéas que nunca fica velho, pois continua correndo no praião como se fosse um garoto de 15 anos, colocando os filhos, genros e netos no bolso, representa um pescador apaixonado. Já para as crianças, como João Victor, Netinho, Felipe e João Marcos, seus netos, ele é um sábio que conhece a direção do vento e a força da maré, sendo mais respeitado que um professor de História ou Medicina, porque ali ele é o garoto do rio, o capitão do barco.
Baruch Há shem!

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